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Senado Federal pode apoiar reforma tributária mais ampla

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Rodrigo Pacheco articula recolocar a PEC 110, que unifica impostos sobre consumo, como base das mudanças no sistema tributário


Israel Medeiros / Correio Braziliense

(crédito: Evaristo Sá/AFP)

As indefinições em torno da reforma tributária do governo federal têm deixado empresários, analistas e políticos insatisfeitos. O projeto que altera o Imposto de Renda foi severamente alterado pelo relator, deputado Celso Sabino (PSDB-PA). Diante da complexidade da proposta, no Senado, o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), articula um eventual retorno da PEC 110/2019 como proposta principal da reforma tributária.

A ideia original do governo era aprovar na Câmara a criação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e a reforma do IR com taxação de dividendos (texto que o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL) quer votar nesta semana). O Senado ficaria com a criação de um passaporte tributário e a criação de um imposto seletivo que substituiria o atual IPI. A união de ICMS e ISS em um IVA subnacional e o que mais restasse seria tratado na PEC 110, também no Senado.

Mas esse entendimento parece ter mudado, segundo fontes próximas a Pacheco. O relator da proposta, senador Roberto Rocha (PSDB-MA), passou a trabalhar em um novo parecer para o texto, com o auxílio de nomes como o da tributarista Melina Rocha. Ele tem o aval do ministro Paulo Guedes, com quem conversou nas últimas semanas. A ideia é amarrar a reforma dos tributos sobre consumo na PEC 110, para garantir uma reforma mais ampla.

Esse modelo de tramitação agrada a indústria, que deve entregar, junto a uma frente de secretários estaduais de Fazenda, um manifesto pela reforma tributária ampla nesta semana. Armando Monteiro, conselheiro emérito da CNI, acredita que a mera união de PIS e Cofins (como quer o governo na primeira fase), não é uma reforma e, portanto, não corrige as distorções do sistema. Para ele, Roberto Rocha “está firmemente empenhado em aperfeiçoar a proposta (PEC 110)” e vem fazendo “um grande trabalho”. Monteiro pontua que a reforma que a indústria deseja tem de ser pela via constitucional e que “o caminho é pela PEC 110”.

“Não tenho dúvida de que o Senado tem que ter protagonismo nessa fase. O presidente da Câmara, Arthur Lira, se destituiu do propósito de fazer uma reforma ampla. Ele desconsiderou o relatório do deputado Aguinaldo Ribeiro para defender a junção de PIS e Cofins. Se o Senado é a casa da Federação, tem toda legitimidade para tratar de impostos municipais, estaduais e municipais”, acrescenta.

Especialistas também acreditam que a PEC 110 é um projeto de reforma tributária mais eficiente do que o modelo faseado proposto pelo governo. Para Ana Carolina Monguilod, sócia do i2a Advogados e professora do Insper, o texto da reforma do Imposto de Renda é “péssimo”. Ela afirma que é contra a tributação de dividendos da maneira prevista pelo relator Celso Sabino – cujos esforços para melhorar a proposta, segundo a professora, têm sido insuficientes.

Isso porque não há, segundo ela, um equilíbrio entre a tributação dos dividendos e a redução correspondente no Imposto de Renda de Pessoas Jurídicas e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Ela aponta que a imprevisibilidade dos impostos pagos por empresários é uma “loucura” e que isso pode gerar insegurança jurídica. “É uma loucura o empresário não saber qual imposto vai pagar porque isso depende de evento futuro. É fazer com que nosso sistema tributário, que não nos dá qualquer segurança jurídica, fique ainda mais incerto”, comenta.

A proposta apresentada pelo governo, na avaliação dela, “vai piorar algo que já é ruim”, aumentando a complexidade do sistema sem “qualquer ideia” quanto aos efeitos sobre as contas públicas. “O melhor caminho é a retirada do PL 2337/21 e voltarmos a debater uma reforma ampla, que efetivamente possibilite a melhora do sistema como um todo. Uma reforma estrutural. Há décadas convivemos com mudanças que representam meros ‘puxadinhos’. O que resultou disso foi um sistema cada vez pior”, opina.

“O melhor caminho é a retirada do projeto para voltarmos a debater uma reforma ampla, que efetivamente possibilite a melhora do sistema como um todo. Uma reforma estrutural. Há décadas convivemos com mudanças que representam meros ‘puxadinhos’. O que resultou disso foi um sistema cada vez pior”, arrematou. “De maneira geral, acredito [que a PEC 110] é um caminho com mais potencial do que os remendos no imposto de renda propostos pelo governo federal”, concluiu.

Já Sergio André Rocha, tributarista e professor da Uerj, aponta que as frequentes mudanças feitas por Sabino no relatório do projeto do IR geram desconfiança. “Há uma dificuldade de se entender a relevância da responsabilidade fiscal. O relator está ali ‘canetando’ o Imposto de Renda, em uma semana é 12,5% a alíquota e na semana seguinte é 2,5%. Corta dez pontos percentuais na alíquota do IR de uma semana para a outra assim sem grande pudor. É difícil acreditar num projeto que flutua dessa maneira”, pontuou.

Defensor de uma arrecadação maior com o Imposto de Renda, Sergio afirma que não houve, até o momento, nenhum projeto de reforma tributária ampla, nem mesmo a PEC 110, mas ele acredita que o projeto relatado por Roberto Rocha tem chances de resultar em uma mudança positiva.

“Venho acompanhando à distância o trabalho que ele está fazendo, assessorado pela professora Melina Rocha. Me parece muito consistente, tentando reestruturar a PEC 110 e fazer ela conversar com o que seria um um IVA federal dentro dessa perspectiva de um sistema de IVA dual. Com o IVA alinhado a práticas internacionais, a gente ter um sistema com menos tributos, da perspectiva tributária, não há objeção. Eu tenho dúvidas se há ambiente político para se fazer isso agora”, completou.

O senador Roberto Rocha e a tributarista Melina Rocha foram procurados pela reportagem, mas preferiram não conceder entrevista, uma vez que o novo parecer do senador ainda está sendo discutido.

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