Setores sugerem desoneração da folha de pagamentos como uma das formas de impedir uma alta nos encargos com a mudança
Por Roberto de Lira
Mesmo com o governo federal apostando suas fichas na aprovação de uma Reforma Tributária ainda no primeiro semestre – o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já confirmou que uma força-tarefa de tributaristas vai integrar a equipe do secretário extraordinário Bernard Appy para acelerar o processo – há dúvidas se uma operação tão complexa tanto do ponto de vista técnico como político conseguirá avançar em tão pouco tempo. E a intenção de não elevar a carga tributária também pode ser uma meta complicada de se atingir.
Um dos primeiros nós a ser desatado é como mesclar as duas propostas já em tramitação no Congresso, a PEC 110 do Senado e a PEC 45 da Câmara, ambas apresentadas em 2019.
A proposta da Câmara dos Deputados propõe a unificação do PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS sobre o valor adicionado criando um Imposto sobre Valor Agregado (IVA), denominado Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), e ainda um Imposto Seletivo sobre bens geradores de externalidades negativas.
No Senado tramita um projeto similar, que sugere unir PIS/Pasep, Cofins, IPI, IOF, CSLL, Salário-Educação, Cide – Combustíveis, ICMS e ISS sobre o valor adicionado, criando um IVA mais amplo. A proposta prevê ainda um Imposto Seletivo sobre combustíveis, energia elétrica, telecomunicações, bebidas e outros.
Cálculos e simulações de especialistas, alguns já incluídos nas propostas originais, apontam que para atingir o objetivo de simplificar o emaranhado tributário atual – que muitas vezes admite a cobrança de tributos sobre tributos durante os vários processos da cadeia produtiva – levaria a uma alíquota de IVA de, no mínimo, 25% no Brasil, uma das maiores do mundo.
Um estudo encomendado pela Central Brasileira do Setor de Serviços (Cebrasse), no entanto, mostrou que o impacto disso seria maior para o setor, uma vez que os cálculos sobre a carga não consideram os encargos trabalhistas – hoje o custo da folha de pagamento já chega a 40% do faturamento.
Assim, o impacto médio para as empresas de 128 setores pesquisados passaria dos 26,64% atuais para 35,88% com o novo IBS no caso no regime de tributação sobre o lucro real. Para as empresas sob o regime de lucro presumido, a carga média saltaria de 21,93% para 34,48%. Em alguns setores, a carga ficaria próxima de 50%. Para não elevar a carga tributária, conforme a intenção do governo, a alíquota do IBS deverão ser de 14,75% no caso do regime de lucro real.
João Diniz, presidente da Cebrasse, disse que o setor não se opõe a uma reforma que simplifique o sistema tributário brasileiro, mas não concorda que haja uma transferência de carga de um setor para o outro, especialmente os voltados ao consumidor final. A associação representa um segmento que engloba cerca de 940 mil empresas e emprega mais de 9 milhões de pessoas.
Diniz afirma que as proposta parte de um conceito equivocado de que as classes mais pobres consomem produtos e as mais ricas consomem serviços. Segundo ele, haverá impacto direto em setores como transportes, comunicação, internet, educação, saúde e até da mão de obra terceirizada, como porteiros, vigilantes, auxiliares de limpeza e recepcionistas, por exemplo.
O próprio presidente da Cebrasse afirmou já ter se reunidos algumas vezes com o atua secretário especial Bernard Appy nos últimos anos para falar de suas preocupações, mas que as respostas sobre eventuais alterações ou pedido de flexibilização eram de que existe um risco de desvirtuar o propósito original
A Associação Comercial de São Paulo (ACSP) mostrou a mesma preocupação da Cebrasse. Além da transferência da carga da indústria para o comércio e serviços, a entidade também destacou que as regras de transição das duas propostas giram em torno de 10 anos, o que implicaria em trabalhar com dois sistemas tributários por um longo período, o que logicamente criaria uma burocracia adicional.
“As empresas já não conseguem entender toda a estrutura tributária e ainda vão ter de conviver com dois sistemas”, afirmou o presidente da ACSP, Alfredo Cutait.
As duas associações propõem a desoneração da folha de pagamento como um dos caminhos para reduzir os riscos que as propostas de reforma trazer. “Deveríamos pensar muito na desoneração da folha. Assim como a Reforma da Previdência, reduz os encargos e aumentará o emprego”, defendeu Cutait.
Além dessa redução, a Cebrasse já sugeriu também a criação de alguma alíquota intermediária para os setores de serviços voltados ao público. “Se não acertarem a calibragem (do IBS) muita gente vai ser prejudicada, afirmou Diniz.
Fonte: InfoMoney