A medida poderá ser aplicada a companhias áreas, telefonia, energia elétrica, gás e rodovias
Por Danielle Brant e Bernardo Caram/Folhapress
Um projeto de lei apresentado na Câmara dos Deputados quer obrigar concessionárias e prestadoras de serviços públicos a comprovar que não têm dívidas com a União para poder reajustar tarifas.
A proposta do deputado Elias Vaz (PSB-GO) foi protocolada na quinta-feira (17). Ele decidiu redigir o texto após levantamento de dívidas ativas de concessionárias de serviços públicos com a União. Os dados foram obtidos na PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional).
No projeto, o deputado propõe incluir na lei que trata do regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos o dispositivo obrigando as empresas a comprovarem a regularidade fiscal antes de terem os reajustes homologados.
A medida poderá ser aplicada a companhias áreas, telefonia, energia elétrica, gás e rodovias, entre outros.
Hoje, a exigência de situação fiscal regularizada já existe para empresas que participam de licitações que envolvam concessão ou permissão. Com a proposta, seria criada a exigência também no momento do reajuste tarifário.
No projeto, ele citou especificamente a situação tributária das quatro maiores operadoras de telefonia e internet do país: Claro, Vivo, Tim e Oi.
Juntas, as companhias têm cerca de R$ 6 bilhões em débitos inscritos na dívida ativa da União.
O maior passivo é o da Claro, segundo o levantamento obtido pelo deputado: R$ 2,1 bilhões. Vivo vem a seguir, com R$ 1,7 bilhão, enquanto a Tim tem R$ 1,1 bilhão e a Oi, R$ 1 bilhão.
“Isso fere o interesse do país. Só essas quatro empresas devem R$ 6 bilhões”, criticou Vaz. “O estado brasileiro precisando de dinheiro, porque nós temos problema sério fiscal, e quatro empresas dando desfalque de R$ 6 bilhões no Orçamento da União.”
“A gente paga. Quando a gente paga a nossa conta telefônica, a gente paga impostos. O que eles não estão é recolhendo os impostos, é imposto que a população já pagou. Até porque se não pagar, eles cortam o telefone.”
A ideia, disse Vaz, é obrigar as empresas a andarem em dia. “Uma das formas é doer no bolso. Se a gente trava essa possibilidade de reajuste da tarifa, a gente entende que vai obrigá-las a não ficarem inadimplentes.”
A dívida ativa reúne débitos de pessoas e empresas com o governo. Os passivos são inscritos no banco depois que o processo regular de cobrança se esgotou na Receita Federal e outros órgãos.
Mesmo dentro das inscrições da dívida ativa, há débitos considerados regulares. Isso porque estão em algum tipo de programa de parcelamento ou dependem de decisão judicial.
No caso das empresas de telecomunicações, a maior parte das dívidas é considerada regular porque há questionamento judicial. Até que a Justiça dê o veredito, essas companhias oferecem como garantia bens em valor equivalente ao da dívida.
Dos R$ 6 bilhões devidos, quase R$ 5,7 bilhões aguardam decisão em processo judicial e estão regularizados por meio de garantias dadas pelas empresas. O último dado computado é de maio deste ano.
Há ainda débitos suspensos na Justiça ou inscritos em parcelamentos do governo. Apenas R$ 127 milhões são considerados irregulares pela PGFN e estão em processo de cobrança.
Portanto, no caso de aprovação do projeto, a limitação dos reajustes de tarifas incidiria apenas sobre a parcela efetivamente considerada irregular pelo governo.
Membros do governo afirmam que os questionamentos na Justiça e o uso de garantias são mecanismos usuais nesse processo.
O advogado Eduardo Telles, sócio do Tauil & Chequer Advogados, também afirmou ser comum que essas garantias sejam oferecidas enquanto a discussão se alonga. Segundo ele, existe a possibilidade de se tratar de imposto não recolhido. No entanto, em muitos casos a tributação é contestada.
“Às vezes a empresa não deixou de recolher, ela só acha que não é devido, discorda da cobrança. Certamente no caso das telefônicas não é ‘não quero pagar’, é muito mais não concordo com essa dívida.”
Na justificativa do projeto, Vaz afirmou que “a maioria esmagadora dos credores opta em firmar contratos de seguro e, assim, oferecem as apólices ao poder público”.
“Essa operação é um grande negócio para as empresas, pois é mais barata quando comparada ao débito”, disse.
“Hodiernamente, no planejamento tributário profissional, as empresas optam em não pagar os impostos, desembolsam uma parcela pequena para as seguradoras, conduzem os processos judiciais até a última instância e ficam com o crédito tributário investido na própria empresa ou em algum ativo financeiro, por exemplo.”
Telles também disse ser possível que a empresa possa vislumbrar um programa de refinanciamento tributário para conseguir desconto na dívida.
Embora algumas empresas usem esses instrumentos para adiar pagamentos e aguardar a liberação de algum Refis (programa de parcelamento com desconto), técnicos do governo afirmam que companhias de grande porte de telecomunicações costumam ter programas de governança arrojados e não costumam usar esses subterfúgios.
Procuradas, as quatro teles encaminharam a demanda da reportagem para a Conexis.
A Conexis Brasil Digital, que representa as principais operadoras de telecomunicações do país, afirmou que o setor tomou conhecimento do projeto de lei e está analisando o texto.
As dívidas das teles:
Claro
Tem R$ 2,2 bilhões inscritos na dívida ativa da União Apenas R$ 300 mil são considerados irregulares e estão em cobrança. O restante está em programa de parcelamento ou pendente de decisão judicial, sendo considerado regular
Vivo
Tem R$ 1,8 bilhão inscrito na dívida ativa da União Do total, R$ 17 milhões são considerados irregulares
Tim
Tem R$ 1,1 bilhão na dívida ativa da União R$ 10 milhões estão em cobrança
Oi
Tem R$ 1 bilhão na dívida ativa da União R$ 100 mil estão em cobrança