As quatro candidaturas que apresentam melhor desempenho nas pesquisas de intenção de voto têm ideias para uma reforma tributária no sistema brasileiro
Por Taísa Medeiros
A complexidade do sistema tributário brasileiro é vivenciada na rotina pelo contador Edson Castro. Colaborador de uma empresa da indústria alimentícia, todos os dias antes de iniciar o trabalho, Castro acessa os sites da Secretaria da Fazenda e da Receita Federal para conferir se houve alguma mudança do ponto de vista tributário.
“Estamos sempre esperando as mudanças. Muitas foram acarretadas por conta da pandemia. Houve aumento de algumas alíquotas, surgiram novos impostos. Realmente, a gente enfrenta uma dificuldade, por isso estou sempre estudando, para estar atualizado”, relata o contador, que ainda aponta que os prazos para adaptação às mudanças são curtos. “A gente tem que estar sempre correndo e estamos sempre lendo e procurando fontes de notícias.”
A empresa em que Edson trabalha realiza revendas para todos os cantos do país. Por isso, o contador enfrenta, ainda, diferentes taxações do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias (ICMS). “Além de alguns estados estarem cobrando o ICMS, há alguns que, quando há uma redução de alguma alíquota, acrescenta outro imposto. Aí você tem que pagar algum fundo de ajuda, alguma outra taxinha para circular a mercadoria, para chegar ao cliente final”, explicou.
Por conta das tantas nuances da tributação brasileira, Edson diz acreditar que, sim, a simplificação dos impostos — que aparece nas propostas de governo — pode facilitar a vida de toda a população. “Na questão do pagamento, pode ajudar. Acredito que a solução seria até viável para facilitar a vida tanto do contador quanto também do empresário que precisa fazer as vendas. Com a alíquota correta e proporcional, facilitaria a vida de ambos”, avaliou.
As quatro candidaturas que apresentam melhor desempenho nas pesquisas de intenção de voto — Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Jair Bolsonaro (PL), Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB) — mencionam a realização de uma reforma tributária no sistema brasileiro. Cada uma a sua maneira explica quais estratégias pretende utilizar para simplificar a taxação no país. O problema é debatido há pelo menos 15 anos. Governos anteriores chegaram a apresentar estudos e projetos com propostas de alterações nas leis fiscais, mas nenhuma proposta foi adiante.
Remendos
“Reforma tributária é um assunto muito complexo. Nossa estrutura tributária veio sendo remendada desde os anos 1960, e ficou cada vez mais complexa. Hoje, se fizermos mudanças, tem setores da indústria que vão ganhar, tem setores que vão perder, tem estados que vão ganhar, tem estados que vão perder. Toda vez que o assunto chega no parlamento, os grupos defendem seus interesses e aqueles que têm privilégios na estrutura tributária vigente procuram frear o debate”, explica o professor Vander Mendes Lucas, da Faculdade de Economia da Universidade de Brasília (UnB).
Na proposta de Ciro, além das críticas à atual taxa básica de juros, o pedetista afirma que a reforma tributária é uma das prioridades do próximo governo para que o país prospere. Nos seus planos de reforma, Ciro pretende reduzir subsídios e incentivos a empresas privadas, recriar impostos sobre lucros e dividendos, adotar o princípio do orçamento base zero e a taxação de grandes fortunas.
“O ex-ministro pretende estimular o setor produtivo, com ênfase nas indústrias e no agronegócio, levando menor tributação ao consumo e maior imposto sobre a renda, o que parece ser, de fato, um bom cenário para o país. Caso ele consiga se eleger e, após, aprovar referidos projetos, esse parece ser o princípio do caminho para um sistema tributário mais justo”, avalia o especialista em direito tributário e sócio do escritório Briganti Advogados, Leonardo Briganti.
Líder nas pesquisas de intenção de voto, Lula defende em seu plano de governo uma “reforma tributária solidária, justa e sustentável”. A sugestão é que os tributos sejam simplificados, o que fará com que pobres paguem menos e ricos paguem mais. “Vamos recolocar os pobres e os trabalhadores no Orçamento. Para isso, é preciso revogar o teto de gastos e rever o atual regime fiscal brasileiro, atualmente disfuncional e sem credibilidade”, diz o texto.
Candidato à reeleição, o presidente Jair Bolsonaro (PL) promete, como parte da reforma tributária, a correção da tabela do Imposto de Renda (IR). “Dentro dos compromissos de desoneração assumidos para a gestão 2019-2022 e dos princípios da responsabilidade fiscal, foi elaborada uma proposta de correção de 31% na tabela do Imposto de Renda”, afirma o texto. A promessa é feita desde a campanha de 2018 do então candidato. Caso houvesse cumprido tal ponto de seu plano de governo, hoje, estaria livre de pagar Imposto de Renda quem ganha até R$ 6.060.
Bolsonaro pretende manter o projeto atual de reforma tributária que visa modernizar a tributação sobre bens e serviços, simplificando o sistema como um todo e buscando permitir que o consumidor tenha mais facilidade em entender a carga fiscal incidente nas suas compras de produtos e serviços.
Por fim, a candidata pelo MDB ao Planalto, Simone Tebet, defende que a proposta que já está no Senado seja sancionada e que pessoas com menor renda paguem menos impostos. “Nós temos três reformas tributárias no Brasil, mas a mais importante, hoje, é a do consumo, porque quem mais paga imposto é o pobre, pois é o que mais consome”, afirmou Tebet, em postagem no Twitter.
A reforma de cada um
O tema permeia os planos de governo dos candidatos à Presidência da República. Apesar de pouco detalhamento, é possível notar os diferentes caminhos que cada candidato aponta como solução para a tributação no Brasil.
Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
O ex-presidente Lula menciona, em seu plano “uma reforma tributária solidária, justa e sustentável”, que deverá ser construída “na perspectiva do desenvolvimento, “simplificando” e reduzindo a tributação do consumo, corrigindo a injustiça ao garantir a progressividade tributária, preservando o financiamento do Estado de bem estar social, restaurando o equilíbrio federativo, contemplando a transição para uma economia ecologicamente sustentável e aperfeiçoando a tributação sobre o comércio internacional”. O programa do petista defende também a intenção de uma reforma no Imposto de Renda (IR), procurando corrigir as desigualdades.
Jair Bolsonaro (PL)
O presidente defende, em seu plano de governo, a realização da reforma para “garantir o emprego e renda e a retomada do crescimento econômico, simplificar a legislação e reduzir a carga tributária”. Bolsonaro pretende, ainda, estimular a redução da tributação das empresas nacionais e também dos impostos de importação, “criando um ambiente de concorrência e competitividade que reduzirá os preços e melhorará a oferta e a qualidade dos produtos e serviços, beneficiando o cidadão”, diz o texto.
Ciro Gomes (PDT)
A reforma proposta por Ciro Gomes pretende diminuir em 20% todas as isenções fiscais distribuídas no país, que somam cerca de R$ 340 bilhões sem qualquer critério ou obrigação de investimento. O pedetista também propõe regulamentar o imposto sobre grandes fortunas, previsto na Constituição de 1988, mas nunca implantado, tributar os lucros e dividendos das grandes corporações empresariais, além de implantar uma alíquota maior sobre as heranças e doações, de caráter progressivo.
Simone Tebet (MDB)
A candidata defende o avanço da reforma tributária que já tramita no Senado em até seis meses, caso seja eleita. A reforma proposta por Tebet deve priorizar a redução da carga tributária sobre a produção, com maior taxação do consumo. A senadora defende, ainda, a segurança jurídica nas relações com o setor empresarial e com investidores, com respeito aos contratos firmados. Para ela, essas ações são fundamentais para reduzir o custo Brasil.
Nada de efeito imediato
Para Fernando Zilveti, professor, livre docente do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT), nenhuma das propostas tornaria o sistema tributário brasileiro mais justo — apesar de a maioria prometer o feito. “Pense num pai ou mãe, chefes de família, negociando com marido ou esposa, com filhos adultos, com receita própria, uma concentração. De um dia para outro o que filhos e esposa (o) ganha será repassado ao chefe (a) de família, que promete repassar uma parte, depois de pagos os gastos da casa. Ocorre que a casa gasta mais do que a receita da família. Pergunto: há alguma chance disso dar certo?”, questiona.
Zilveti defende que seja feita, antes mesmo da reforma tributária, uma reforma administrativa. “Diminuído o gasto público se abrirá espaço para a reforma com queda de carga e justiça fiscal. O resto é demagogia, como está nos planos de todos os candidatos”, aponta.
Na avaliação do professor Vander Mendes Lucas, o Brasil arrecada bem, porém precisa aprender a gastar melhor. “Já estamos no limite de arrecadação, não tem como arrecadar mais. Se você tentar apertar mais um pouco, a sonegação vai aumentar. A ideia é simplificar, mas é preciso ter cuidado”, alerta.
Fonte: Correio Braziliense